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Entretenimento - 10 de julho de 2014

50 anos de Deus e o Diabo: Glauber Rocha adorava polêmica, diz Othon Bastos

 

As filmagens de “Deus e o Diabo na Terra do Sol”, um marco do cinema nacional dirigido por Glauber Rocha, foram cercadas por lendas e devaneios. No aniversário de 50 anos de lançamento do longa, a ser comemorado nesta quinta-feira (10), as histórias fantásticas ainda são lembradas por Othon Bastos, ator que deu vida a Corisco, braço direito de Lampião no filme.

“Você não sabe o que aconteceu na cena em que Corisco aceita Manuel [Geraldo Del Rey] no bando e o batiza como Satanás”, provoca o ator de 81 anos, em entrevista. “A filmagem era em um descampado e ventava muito. Corisco chama Manuel e diz: ‘Manuel é nome de vaqueiro. A partir de agora, você se chamará Satanás’. E pá, coloco o chapéu na cabeça dele. Nesse momento, o vento bate e toca as cordas do violão”, relembra, batendo com as duas mãos na mesa.

“O vento faz ‘blim, blem, blim, blem, blim, blem’, bem devagar, como uma melodia. Não sei se Glauber era religioso, mas ele quis saber: ‘Meu Deus, o que é isso?'”. Othon repete o som sinistro do violão mais duas vezes.

O encontro “olho no olho” com Othon Bastos foi exigência do próprio ator. “Só falo [sobre o filme] se for pessoalmente. Esse filme é importante demais e eu preciso olhar no seu olho para contar como foi”, disse ele, dias antes por telefone, à reportagem. Pedido atendido, a entrevista aconteceu em dia de jogo do Brasil contra a Colômbia pela Copa do Mundo no Parque Lage do Rio de Janeiro, local que já foi cenário de outro filme de Glauber, “Terra em Transe” (1967).

“Deus e o Diabo na Terra do Sol”, segundo filme de Glauber Rocha — que morreu em 1981, aos 42 anos, vítima de problemas pulmonares –, inovou na linguagem cinematográfica ao colocar em prática o bordão “uma câmera na mão e uma ideia na cabeça”. Foi este longa, uma saga sobre o sertão nordestino, que alçou o diretor à categoria de um dos principais nomes do Cinema Novo.

Othon, que vive atualmente no Rio de Janeiro, destaca a relevância do filme de Glauber nos dias de hoje. “Parece que foi feito ontem. São temas atuais, como o homem comprado pelos coronéis para acabar com o povo. Tem ainda a vingança do humilde, do mais fraco”, ele ressalta.

Lançado em meio à ditadura militar, o filme precisou sair escondido do Brasil. Foi indicado a Palma de Ouro do Festival de Cannes de 1964 e seu emblemático cartaz, criado por Rogério Duarte, saiu na capa da revista francesa de cinema “Positif”.

No Brasil, o sucesso foi ainda mais estrondoso. “Quando o filme foi lançado, o Glauber me ligou: ‘Othon, o filme é um deslumbre, as pessoas estão enlouquecidas’. Depois disso, perdi as contas de quantos convites recebi para fazer cangaceiro, assassino, ladrão, estuprador. Respondia sempre a mesma coisa: ‘Já fiz um cangaceiro para não fazer mais nenhum'”.

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